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20 de outubro de 2015

Ouça 5 álbuns de Jazz que não figuram em listas, mas bem que mereciam


Por Leonardo Alcântara

Listas são sempre listas, né? Entre os poucos consensos, há um debate caloroso sobre elas, sobretudo com as suas supostas 'injustiças'. "100 melhores discos de Rock", "100 melhores discos da MPB" ou "Meus discos favoritos" são frequentes nos sites da imprensa especializada e com o jazz não é diferente. Entre no google e digite "Top Jazz Albums", "Greatest Jazz Albums" e "Essential Jazz Albums", por exemplo, e terás uma infinidade de listas e seus comentários calorosos sobre algum disco que não entrou.

Diagonal, clássico de Johnny Alf, de 1964
Eu mesmo já fui um cara que metia a lenha nos comentários. Até hoje eu reclamo de como "Missa Breve" (Edu Lobo), "Slave Mass" (Hermeto Pascoal) e "Diagonal" (Johnny Alf), não entram na maioria das listas conhecidas, como a da Rolling Stone e a da antiga revista MTV. Como que a mesma Rolling Stone me cria uma lista com as "100 Maiores Vozes da Música Brasileira" e não cita Alaíde Costa em nenhuma linha?

Tem sugestões para a lista? Comente!

Certamente, alguns critérios dos colaboradores dessas listas são questionáveis, mas vale lembrar, que diante de uma discografia tão extensa e tão rica como é na MPB e no Jazz e uma legião de artistas notáveis e lendários, sem dúvida alguma que 'injustiças' acontecerão. Se 100 discos encabeçam uma lista de melhores discos de Jazz, certamente que outros 100, 200 ou 300 discos mereciam entrar, mas o que fazer se só cabem 100?

Kind of Blue, de Miles Davis: o disco
de jazz mais vendido de todos os tempos
Entre as listas de Jazz, há um consenso óbvio: sempre estarão os clássicos "Kind of Blue" (Miles Davis), "A Love Supreme" (John Coltrane), "Time Out" (Dave Brubeck) e "Saxophone Colossus" (Sonny Rollins). Por quê? Pois além do êxito comercial, esses clássicos foram, de alguma maneira, vitais na evolução do Jazz e na aproximação de novos adeptos para o gênero. O clássico de Miles Davis, por exemplo, além de ter instaurado a revolução do Jazz Modal e contar com aquele que é considerado o maior quinteto da história (Cannonball Adderley, Paul Chambers, Jimmy Cobb, John Coltrane, Bill Evans e Wynton Kelly - em apenas uma faixa -), Kind of Blue é o disco de jazz mais vendido de todos os tempos, fazendo o que poucos artistas conseguiram: levar o jazz conceitual para as massas. Tais feitos, legitimam o Kind of Blue como o cabeça das listas de jazz.

Mas um disco precisa ser revolucionário ou vender muito para entrar em uma lista? Claro que não! Mas são critérios relevantes na hora de se elaborar uma. Entre 300 discos para uma lista de 100, inúmeros serão os critérios de desempate para se chegar ao resultado final. Justo, não?

Vale lembrar que para um disco ser bom, ele não precisa de listas famosas. Ele só precisa de uma coisa: comover quem ouve. Entre os álbuns da minha coleção, muitos não estão sequer em listas de 200 discos, mas fazem parte da lista mais importante da minha vida: a minha lista!

Separei 5 álbuns de jazz que não figuram nas listas com os termos buscados no google, mas bem que mereciam e eu vou explicar o porquê:

1 - Una Mas - Kenny Dorham (1963)

Sempre que se fala em grandes jazzístas, Kenny Dorham é praticamente esquecido. Jackie McLean chegou a dizer: "Eu gostaria de fazer um livro com alguns músicos que sinto que foram deixados para trás... como Kenny Dorham. Muita gente conhece Kenny, mas durante toda sua vida, ele nunca recebeu as honras nem as rosas que deveria ter recebido por tudo o que ele nos deu". Eu adoro o trompete e de todos os trompetistas que eu já ouvi, sem dúvida que Dorham é um dos que mais me influenciaram a gostar de jazz. Eu amo o seu fraseado, seu compasso intenso e seu ritmo. A injustiça sobre a sua história é a que mais me incomoda. Expoente do Bebop, Dorham simplesmente participou da primeira gravação dos Jazz Messengers com o baterista Art Blakey e o pianista Horace Silver. Depois, fundou o Jazz Prophets que, assim como o Jazz Messengers, serviu de ponte para o lançamento de novos talentos, como Joe Henderson, Kenny Burrell, Herbie Hancock e Tony Williams (os dois últimos tocaram com Dorham antes de tocarem com Miles Davis). Depois transitou no Afro Cuban Jazz, até chegar ao Brasil em uma turnê no início da década de 1960 e se encantar com a Bossa Nova. Assim nasceu, em 1963, a obra-prima Una Mas. Lançado pela Blue Note, a edição original traz 3 temas recheados de balanço e exprime um Dorham na sua melhor forma. Solos intensos, a batida sincopada, o piano cheio de swing latino de Herbie Hancock, fazem de Una Mas uma das maiores obras de jazz que eu já ouvi. Fora a faixa "São Paulo", uma homenagem de Dorham à cidade que nunca para. Tanto não para, que nem o fã de jazz mas assíduo de SP sabe disso. Infelizmente, Una Mas é o penúltimo álbum da carreira de Dorham, que chegara a gravar Trompeta Toccata, em 1964, e depois entrar em absoluto ostracismo. Dorham morreu em 1972, aos 48 anos.



2 - Night Dreamer - Wayne Shorter (1964)



Iniciando no selo Blue Note, Wayne Shorter gravou, em 1964, o álbum Night Dreamer. Introspectivo, sofisticado e, diria até, excitante, o álbum é considerado um divisor de águas, uma vez que a partir desta gravação, o saxofonista passou a se apropriar de uma linguagem mais lírica e simples, solando com mais confiança e dando espaço para um fraseado límpido em lindos jazz ballads. Lee Morgan (Trompete), Reginald Workman (Baixo), Elvin Jones (Bateria) e McCoy Tyner (Piano) formam o quarteto estrelar que acompanha Shorter nesta gravação. A atmosfera por vezes impressionista e por vezes cinza e reflexiva, revela um ambiente modal e uma unidade rítmica sutil, como poucos álbuns conseguiram transmitir. É um disco praticamente perfeito. Se os quadros de Monet ou Degas tocassem música, certamente eles tocariam Night Dreamer.


3 - Black Woman - Sonny Sharrock (1969)


Mais do que um magnífico álbum de Jazz, o emblemático Black Woman, de 1969 é um manifesto do guitarrista Sonny Sharrock. Produzido por Herbie Mann para a Atlantic Records, o disco é uma mistura de rock, jazz, avant-garde, gospel e soul, tudo junto, em uma linguagem free, com Sharrock dilacerando a sua guitarra atonal e contrastando com o canto de lamento e gemidos ofegantes de sua esposa Linda Sharrock. Trata-se de um verdadeiro registro sonoro sobre a voz da mulher negra em uma América racista e segregada. O disco por inteiro é imprevisível, excêntrico e explosivo, que pode soar desafiador para aqueles que não estão acostumados com o free-jazz, mas quando compreendemos a proposta e nos deparamos com as lágrimas e a dor da voz de Linda, que aqui é tão ressonante quanto um sax tenor, você fica profundamente sem reação.


4 - Speak Like a Child - Herbie Hancock (1968)

Ouça Speak Like a Child:


Ao gravar o aclamado Maiden Voyage, de 1965, Herbie Hancock mostrou que era um dos jazzístas que mais bem soube assimilar as lições modais de Miles Davis. Em Speak Like a Child, gravado em março de 1968, Herbie deu continuidade à atmosfera conceitual de Maiden Voyage, tendo como tema o amor representando na ingenuidade de uma criança. Não que o álbum soe infantil, muito pelo contrário, mas revela os valores o desejo de pureza e espontaneidade, na esperança, segundo as próprias palavras de Herbie nas notas do álbum: "de pensar e sentir as possibilidades de fazer o nosso futuro menos impuro". É um disco descontraído, lírico e melodicamente incisivo. A música Speak Like a Child foi inspirada na foto de capa, tirada pelo fotógrafo David Bythewood, revelando o beijo inocente e sutil de Herbie e sua esposa Gigi Meixner, que em setembro daquele mesmo ano se casaram e passaram a lua de mel no Rio de Janeiro.

5 - Pres and Teddy - Lester Young e Teddy Wilson (1959)


Mesmo com a saúde já fragilizada por conta do seu alcoolismo, o saxofonista Lester Young deixou o melhor de sua carreira para o final. Gravado em 1956 e lançado em 1959 - ano da morte do saxofonista -, Pres and Teddy apresenta o encontro de dois monstros sagrados do jazz. A sutileza do sax tenor de Lester, tão sutil que por vezes parece um sax alto, se mescla com o piano cheio de balanço de Teddy Wilson. Diferente de suas gravações nos anos de 1930 e 1940, onde apresentava um timbre mais descontraído e inclinado para o swing, Pres and Teddy revela um Young com alta carga emocional, solando mais belo do que nunca sobre o passeio alternado do piano de Teddy, ora ligeiro e ora sublime. As marcas de um ex combatente de guerra, que viveu as as alegrias e as ilusões da carreira artística estão todas naquele sax torto, que soa como uma pétala no ar, mas que é um verdadeiro turbilhão aos corações. Eu duvido que você consiga ouvir 'Our Love Is Here to Stay' sem ficar comovido. Eu não consigo. JM 


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