Por Leonardo Alcântara (JazzMan!)
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Eu estava procurando alguns cds de João Gilberto para completar a minha coleção e fiquei indignado ao encontrar mais ofertas e ótimos preços (tem cd por 3 dólares) em sites do exterior do que aqui no Brasil, onde a obra do nosso maior criador musical é escassa e simplesmente ignorada. Mas sobre essa questão não preciso me aprofundar, pois estamos mais do que acostumados com o nosso país emblemático, que mesmo com tanta desigualdade, com tanta falta de tanta coisa, consegue ser tão rico culturalmente e produzir a melhor música do mundo para delírio do mundo e para o nosso desprezo. E sei que isso não culpa do nosso povo e os 'grandes' culpados sabemos bem quais são.
Diante deste cenário, deste contraste, o que mais me faz chorar é que João Gilberto, por mais imortal que seja a sua obra, está velho como um simples mortal e logo bate aquela tristeza de saber se ainda veremos mais uma vez aquele senhor de talento tão raro e misterioso. Admito que isso me deixa muito angustiado... Por mais natural que seja a velhice e por mais irracional que eu esteja sendo, é muito duro pensar em um mundo sem João Gilberto, sua qualidade, seu sorriso infantil e a sua busca constante pela excelência.
Quando vi João Gilberto uma única vez, no Teatro Municipal, fui o homem mais realizado do mundo. Mas eu queria mais... eu quero mais não posso. Mesmo com tanto POP, com tanto avanço da medicina, com tanto crescimento, com tanto smartphone e tanta liberdade, trocaria tudo isso para estar ali em 1958 com Elizeth, na Canção do Amor Demais, no embrião de uma das nossas maiores invenções, que fizeram com que o Brasil deixasse de ser um mero exportador matérias-primas e mostrasse a sua verdadeira força para o mundo. Sim, eu sou puro 'saudosismo', bem como Caetano canta. Ainda sou um homem do tempo do amor, do sorriso e da flor, da rua Nascimento Silva e de Ipanema que era só felicidade.
Sei que eu tenho os discos, os cds, os vídeos, os milhares de MP3 com músicas do João, mas nada se compara com a presença em carne e osso daquele senhor meio corcunda, vestindo paletó, buscando o máximo no mínimo, subvertendo a própria perfeição. Me dói muito saber que logo ficarão apenas os registros. A vida é assim, inclusive para os gênios...
Apesar da dor, também me alegro em saber que muitos dos seus discípulos estão aí e que tantos mais buscam em João a elegância, o refinamento, o primor e a excelência musical. Gosto de ouvir o meu amigo Bisdré Santos e saber que João está ali no seu violão junto com Baden, Toquinho, Rabello... Como é bom também ouvir Ithamara Koorax e Valéria Lobão e me deparar com tanta qualidade e tanto cuidado, daquela maneira que só João nos ensinou e que elas praticam tão bem. E há tantos outros que eu tanto amo e que não deixam o conceito de João Gilberto desaparecer. E outros virão, sem dúvida, pois a força gilbertiana é maior do que imaginamos.
A vida sempre seguirá com sua beleza, seus ciclos e contradições, mas uma coisa é certa: de uma forma ou de outra, João sempre está aí para quem quiser aprender o que é felicidade. JM
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